“O corpo virou um instrumento, virou uma orquestra na mão desse cara. Um instrumento é pouco, porque o que ele fazia com os pés, o que fazia com os joelhos, o que fazia com o pescoço dele, com as mãos, ele é um cara de expressividade absurda, de uma criatividade absurda.
Ele era um bailarino. Qualquer um que olhasse Michael Jackson dançando também queria dançar. E isso é a coisa mais importante que pode haver no mundo dessa e de qualquer outra arte. O planeta inteiro -crianças, adolescentes e adultos- passou a imitar as coreografias que ele desenvolveu, seu breque, sua maneira de quebrar a música no corpo, a forma como unia os passos ao ritmo.
O jeito de ele dançar era hip hop, era funk, era breakdance -mas não resultava em nada disso, porque era reinvenção.
Tinha as proporções de um bailarino. Pernas compridas, mãos enormes, aqueles braços. Seu corpo era completamente expressivo. Como Pelé, nasceu com as medidas perfeitas.
A dança é uma vida muito árdua, exige grandes esforços. E Michael era um símbolo total disso. Completamente meticuloso, perfeccionista. Ficava visível que todos aqueles passos estavam milimetricamente calculados. Uma precisão acima da perfeição. Mas, ao mesmo tempo, era indisfarçável o prazer que sentia ao fazer aquilo. E nem precisava dançar.
No clipe que gravou aqui no Brasil, Michael quase só andava. Mas com uma elegância e uma destreza comparáveis apenas às de Fred Astaire -que de fato era um de seus ídolos.
Aprendi a ter prazer no meu ofício olhando Michael dançar. Se a minha companhia existe, se a dança está dentro de mim, responsabilizo totalmente esse homem por isso. Ele teve momentos mais exuberantes, discos menos brilhantes, mas uma festa sem Michael não acontece. É como se eu não tivesse ido.
Essas coisas são incomparáveis, mas John Lennon me passou pela cabeça. Quando a gente vai ter a possibilidade de ter outro cara como esse?
Saímos perdendo. A humanidade sem Michael Jackson está atrasada.”
Deborah Colker (Rio de Janeiro, 1961) é uma bailarina e coreógrafa brasileira, conhecida por seus balés aclamados pela crítica, nacional e internacional.
Alguns de seus trabalhos foram Nó, Casa, Rota, 4×4, Cruel e, mais recentemente, Dínamo. É a primeira mulher a dirigir um show do Cirque du Soleil, Cirque 2009. Foi considerada pela Revista Época uma dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009.
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